As férias de Verão chegaram, com o bom tempo e os dias longos. Com elas vem a disponibilidade para passar mais tempo ao ar livre com a família – tanto a de 2 como a de 4 patas. E a tentação de andar com o nosso companheiro canino à solta é naturalmente grande, tanto mais que no resto do ano, por razões diversas, normalmente temos menos tempo disponível para ele. Mas será que o devemos fazer de qualquer maneira?
Dificilmente alguém irá contestar o facto que os cães precisam de andar à solta. São animais sociais e activos, que precisam de poder desgastar regularmente as suas energias e de ser estimulados física e psicologicamente. Os simples passeios higiénicos diários, à trela, rápidos e em sítios conhecidos, dificilmente serão suficientes para satisfazer as necessidades dos nossos companheiros. Ao contrário do que popularmente se pensa, mesmo os de pequeno porte não satisfazem as suas necessidades de exercício com o andar em casa; muitas vezes, têm mesmo necessidades proporcionalmente maiores que as de cães de porte superior.
Quando correm bem, os passeios à solta são uma excelente oportunidade para reforçar os laços e cumplicidade existentes entre o dono e o seu cão. Mas existem numerosas oportunidades para que corram mal, e o dono deve estar ciente delas para se poder precaver.
Bom senso… e obediência!
A maioria dos riscos, infelizmente, advém muito da falta de cuidado… Vezes demasiadas se vêm cães sem trela, mesmo em espaços confinados e/ou desconhecidos, a manifestar evidentes sinais de stress, a embater contra objectos (nomeadamente as cada vez mais presentes portas de vidro, que os cães não apreendem de imediato que constituem uma barreira, por verem o que está do outro lado). Um cão à solta tem, por inerência, maior probabilidade de se magoar ou de causar danos, mesmo que não intencionalmente. Um cão que se assuste ou que persiga algum animal, facilmente corre para o meio da estrada, arriscando-se seriamente a ser atropelado. Ou a embater em alguém, por estar mais focado no que está a perseguir do que no que se passa em seu redor. Um cão à solta deve ser um cão treinado, obediente, que responda à chamada do seu dono qualquer que seja a situação, de forma a precaver situações problemáticas. Isto é necessário não só em espaços abertos, mas mesmo também quando se tem o animal à solta em espaços vedados, como parques para cães – não deixa de haver pessoas e outros cães a quem é necessário prestar atenção, para que o passeio seja uma experiência agradável para todos os envolvidos.
Propensão racial
Algumas raças têm tendência a serem mais atentas ao dono, enquanto outras tendem a ser mais independentes. Os cães de pastoreio, por exemplo, tendo sido selecionados para trabalhar sob a supervisão de pessoas, tendem a ser mais responsivos aos desejos do dono e a permanecer mais nas suas imediações, e o inverso tende a ocorrer com os cães de montanha, mais independentes e exploradores da área em que se encontram. Já os sabujos, por exemplo, apesar de serem bastante atentos ao dono, quando encontram um cheiro que lhes interesse e começam a seguir o rasto, manifestam uma notável “surdez selectiva”. Isto porque essa actividade é para eles bastante mais atractiva e recompensadora que a mera presença do dono (por muito que custe a alguns donos assumir isto). Naturalmente, isto são as tendências gerais, e existe muita variação individual dentro de cada raça, frequentemente até mais que entre raças. No entanto, é uma boa regra empírica considerar os diferentes tipos raciais e a sua tendência para se comportar de forma diferente quando estão à solta, para os donos implementarem estratégias para assegurar a obediência do seu cão em qualquer situação – há que procurar garantir que constituem o principal foco de interesse do seu companheiro, mais interessante que qualquer outra actividade.
“Ele só quer brincar!”
Está você na praia a relaxar quando, vindo do nada, aparece um cão a correr atrás de uma bola atirada por alguém, fazendo uma curva apertada mesmo em cima da sua toalha e dando-lhe um banho de areia. Como se isso não fosse suficiente para destruir a sua boa disposição, um outro sai do mar e sacode-se vigorosamente ao seu lado, dando-lhe desta vez literalmente um banho de água fria. Por muito que goste de cães, este não será certamente um dos seus momentos favoritos!
Quando passeia no parque, a situação poderá tornar-se ainda mais complicada. O seu cão até poderá só querer brincar, mas as outras pessoas têm também direito a poder disfrutar o espaço público da sua forma, sem serem importunadas. Ele até pode ser o cão mais simpático e bonacheirão da zona, mas isso não é razão para deixar o seu S. Bernardo de 70 kg ir a correr desenfreadamente para cima de um transeunte a pedir-lhe festas, enchendo-o de baba, só porque “ele só quer brincar”. Ou para deixar o seu Collie andar a correr à volta das pessoas tentando juntá-las num único grupo, mordiscando os seus calcanhares (comportamento de pastoreio). Deve ainda ser prestada atenção especial a locais ondem andem pessoas de bicicleta, patins, trotinetes, etc., já que a maioria dos cães tende a associá-los a presas a perseguir.
Se o seu cão não estiver habituado com crianças, ou pouco, vigie-o cuidadosamente em zonas onde haja garotos a brincar. As crianças têm uma forma e um comportamento diferente do dos adultos, e cães que a elas não estejam habituados poderão não as apreender como pessoas, mas sim como brinquedos animados ou presas a perseguir.
“Ele não morde!”
Quando um cão está excitado a aproveitar os seus poucos momentos à solta e se apercebe de outro cão, muitas vezes a tendência é ir a correr ter com o outro. Quase automaticamente, o dono frequentemente deixa-o ir, limitando-se a comentar para o dono do outro “Não faz mal, o meu cão não morde!” Mas será uma situação assim tão simples e inocente?
Por um lado, o seu cão poderá efectivamente não morder numa situação normal, mas o dono nada sabe sobre o outro, se é agressivo, se está assustado, etc. Será sensato expor qualquer dos cães a uma situação de potencial risco sem tomar as medidas adequadas?
Por outro lado, e frequentemente em virtude do isolamento social a que a maioria dos cães urbanos estão sujeitos (muitas vezes imposta pelos donos, que de imediato afastam qualquer cão que se tenta aproximar do seu), muitos não sabem aproximar-se educadamente de outros cães cumprindo as regras de etiqueta canina. Numa abordagem correcta, os dois cães aproximam-se calmamente, com uma postura relaxada, sem fixarem o olhar um no outro (poderão alternar o olhar para o outro com o desviarem o olhar), posicionam-se lado a lado, para cheirarem a região peri-anal do outro (o equivalente canino ao aperto de mãos humano) e, não havendo tensão, poderão prosseguir o seu caminho ou tentarem brincar um com o outro. Quando esta abordagem não é adequadamente efectuada, poderão surgir problemas por má interpretação das intenções. Por exemplo, é comum, quando os cães estão muito excitados, virem a correr directamente para o outro, parando mesmo em frente dele. Num equivalente humano, pense num desconhecido que o vê à distância e vem a correr para cima de si, parando a poucos centímetros. Desagradável, não?
Numa situação destas, um cão mais confiante poderá exibir sinais tentando acalmar a situação, como o afastar-se calmamente, manter-se no mesmo local mas pôr-se a cheirar o solo (quase de certeza que o chão não é mais interessante que o outro cão, mas mostrando desinteresse, pode ser que o outro cão acalme), lamber os lábios, etc. Caso o cão seja inseguro e/ou não tenha possibilidade de escolher o que fazer (como acontece quando o cão está à trela), poderá eventualmente exibir sinais de agressividade (eriçar do pelo, arreganhar os lábios, rosnar…), de forma a tentar desencorajar o outro cão de se aproximar. Também os donos podem, inadvertidamente, contribuir para aumentar a tensão nos encontros. Por exemplo, ao desconhecerem as normas de conduta canina, há quem impeça os cães de cheirarem a região anal, por acharem esse comportamento repugnante. Mais frequente ainda é os donos ficarem nervosos com a aproximação de um cão desconhecido e fazerem tensão na trela, num comportamento quase reflexo de procurar segurar melhor o seu animal. Ora, o cão vai sentir essa tensão e ficará a pensar que efectivamente a situação poderá ser problemática, o que poderá levar a um aumentar da real tensão. O ideal, numa situação em que ambos os cães estejam à trela, é vigiar calmamente a linguagem corporal dos cães envolvidos, mantendo a trela lassa para não criar tensões desnecessárias. Quando ambos os cães estão à solta, não há o elemento humano a “complicar” a aproximação entre os cães, e qualquer um pode optar por se afastar, mas nem por isso se deve descurar a atenção ao comportamento dos animais. Uma má interpretação do comportamento por parte de um deles, ou desconhecimento do significado das posturas corporais (há que não esquecer que muitos cães vivem num ambiente virtualmente humano, desde cachorros com pouco ou nenhum contacto com outros cães) poderá levar ao surgimento de conflitos. Mas quando um dos cães está à solta e o outro está à trela, poderá haver o problema da sobre-excitação do cão à solta aliado à tensão apercebida pelo dono e o cão preso, que não tem a possibilidade de se afastar se o desejar; à falta da hipótese de fuga, ao cão receoso resta a do ataque... O dono do cão à solta tem então a responsabilidade acrescida de procurar assegurar que o seu cão não perturba o outro cão.
Peça autorização primeiro… e vigie
Uma forma simples é manter o seu cão perto de si e perguntar primeiro ao dono do outro se se podem acercar. Caso o dono recuse (pode ter um cão receoso, agressivo, frágil, em tratamento, etc.), respeite e prossiga com o seu passeio. Caso aceite, vigie a interacção entre os cães. Observe como se aproximam, e se o seu cão começar a ficar demasiado excitado, chame-o de volta, apenas permita abordagens calmas, de forma a evitar mal-entendidos e riscos. Após as apresentações, caso ambos os cães queiram brincar um pouco, não baixe a guarda. Apesar de na brincadeira os cães usarem normalmente numerosos sinais indicadores que o que estão a fazer não é para ser levado a sério, de forma a tranquilizar o seu companheiro, diferentes cães podem ter diferentes formas de brincar – uns gostam de ser mais físicos na brincadeira, outros preferem jogos mais calmos… Deve ser prestado especial atenção às brincadeiras entre cães de porte muito diferente, pois há risco de o cão maior sem querer magoar o mais pequeno. Aliás, essa é a principal razão para a recomendação de haver dois recintos separados nos parques para cães, para que animais de diferente porte possam interagir em segurança com cães do seu tamanho.
Respeite para ser respeitado
Por muita vontade que tenha de andar sempre com o seu cão bem educado à solta (independentemente da legalidade ou não da situação), tenha em mente que há pessoas que têm medo de cães ou que, mesmo não os receando, não apreciam particularmente tê-los perto de si. Muitas pessoas não sabem interpretar correctamente a expressão corporal dos cães, e podem sentir-se ameaçadas pela abordagem de um cão desconhecido. Não se esqueça que na maioria dos espaços públicos os cães devem circular à trela, e é-lhes inclusive interdito o acesso a vários locais. Apesar de tradicionalmente haver uma certa tolerância quanto a estas liberdades, há que respeitar os outros! Aprenda a interpretar a linguagem corporal dos cães, mantenha o seu cão à trela ou junto a si quando está perto de outras pessoas, não o deixe aproximar-se de pessoas ou cães sem autorização e nunca se esqueça de recolher os dejectos que o seu cão faz, mesmo quando este anda à solta. Se todos respeitarmos as regras elementares de bom senso, respeito e sã convivência, pode ser que gradualmente se comece a mudar as mentalidades e a conseguir o acesso legal dos cães a cada vez mais espaços públicos.
Boa noite, precisava de esclarecer uma duvida, os cães do meu vizinho estragam o meu cultivo e ja foram avisados e não dão importância, o que posso fazer?
ResponderEliminarIsso é sempre uma situação complicada. Tente falar com o seu vizinho com calma, fazê-lo ver a situação, mas sem que se exaltem (o que só piora a situação). Pode colocar uma cerca à volta do seu cultivo, impedindo a entrada a quem não tenha acesso ao portão.
ResponderEliminarSuponho que, em última análise, isso possa ser considerado invasão de propriedade alheia, e o dono de um cão é responsável pelos danos que este ocasione, pelo que se nada mais resultar, poderá dirigir-se às autoridades competentes.
Mas seguramente que com umas conversas tranquilas conseguirá resultados.
Boa sorte